Quando estava escrevendo a minha tese, lembro de ter lido um artigo de um filósofo alemão contemporâneo, Wolfgang Welsch, onde ele dizia que “(..) assim como o século XX foi o século da arte, o século XXI será o século do design”. Fiquei impressionada com a frase desse estudioso da estética, e cheguei mesmo a trocar alguns e-mails a respeito. E cada vez mais me convenço de que ele está pleno de razão.
Com esse papo todo das Olimpíadas em Pequim, acabei me lembrando do 7o Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, que aconteceu em Curitiba, em 2006. Fui apresentar um artigo e saber em que pé está o estado-da-arte do design nesse país. Conheci muita gente, revi colegas, assisti a palestras, conferências e apresentações. Alguns dos maiores autores do design estiveram lá, como o alemão Bernhard Bürdek. Trabalhos inéditos foram lançados, pesquisas criativas foram apresentadas, mas o que mais me impressionou mesmo foi a apresentação da professora Wan-Ru Chou, do Departamento de Design Industrial da Shih Chien University, de Taipei, Taiwan.
A primeira informação impactante foi que o número de cursos superiores de design na China cresceu assombrosos 2000% desde 1980 (em 2006 eram cerca de 400 escolas — hoje deve ter crescido mais ainda). O dragão já se deu conta de que esse é um requisito imprescindível para continuar no mercado, mesmo porque o trabalho escravo praticado lá não deve se sustentar por muito mais tempo. Por mais selvagem que seja o capitalismo, as consciências dos consumidores começam a incomodar (que o diga a Nike, cujas ações se desvalorizaram em 50% quando descobriu-se que a empresa utilizava mão-de-obra infantil, em 1995).
A simpática Wan-Ru Chou (e, cabe ressaltar, com um inglês competentíssimo) mostrou como os chineses fazem a lição de casa. Todo mundo sabe que o design é um curso multidisciplinar, mas a coisa aqui sempre fica só no discurso. Lá, eles levam a prática a sério: há festas regulares em prédios especialmente construídos, onde estudantes de design, engenharia, arquitetura, moda e comunicação se reúnem em baladas performáticas onde todo mundo mostra seus talentos menos ortodoxos. Rolam concursos de trajes e a decoração é toda temática.
E a criatividade vai ainda mais além em um concurso de artefatos móveis. É assim: cada aluno (ou equipe) precisa construir um protótipo de uma geringonça que consiga transportar uma pessoa por um circuito de 10 metros de comprimento que inclui uma discreta inclinação. A engenhoca pode ser movida a qualquer tipo de propulsão, desde mãos nervosas até discos excêntricos. Como o objetivo é desenvolver a criatividade, não há preocupação com a viabilidade técnica ou de produção em escala. Basta que o percurso de 10 metros seja concluído (mesmo que com sobressaltos; houve até protótipos que se desintegraram devido ao esforço). Divertido, integrador, original, poderoso.
Mostrou-se também outras práticas de dar inveja em qualquer estudante brasileiro: intercâmbio com universidades do mundo inteiro; workshops com designers-referência em suas áreas; laboratórios equipadíssimos.
É. A China não está aí para brincadeira. Tudo indica que o país do futuro é o deles, não o nosso. Pois, como diz o conhecido consultor americano Rodney Fish, “somente uma empresa pode ser a mais barata. As outras terão que usar o design”.
Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br