Arghdesign #5: Beer designers

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Você pode reclamar do cake designer que fez seu bolo de aniversário. Pode reclamar do designer de sobrancelhas do seu bairro ou do hair designer da sua mãe. Mas convenhamos, falar em Beer Designers é muito mais divertido. Além disso, é um tema ótimo para retomar esta coluna depois de três semanas de hiato – desviando um pouco (muito) do foco deste blog, ainda que seja sempre bom ouvir sobre outros assuntos fora do nosso mundinho fechado. Se o assunto em questão envolve canecos batendo e cereais fermentados descendo goela abaixo, tanto melhor!

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Dia 30 de agosto, em um belo sábado quente de inverno de Belo Horizonte, foi realizado o III Concurso Nacional de Cerveja Artesanal. Em uma chácara nos subúrbios da cidade, cervejeiros do país inteiro se reuniram (de táxi, é claro) para distribuir suas produções próprias, “provar” (interprete como quiser) as mais de 15 microcervejarias presentes no evento e “debater” (de novo, interprete como quiser) sobre esse fantástico assunto que é a cerveja produzida em casa. E aqui posso fazer o comparativo: cervejeiros também sofrem de uma certa crise de identidade. Mas essa “crise” vem da ainda inscipiente cultura cervejeira nacional. Quando falamos de estilos de cerveja, existem as escolas belga, alemã, tcheca, britânica e norte-americana… mas não uma escola brasileira. É isso aí, povo: designers não são os únicos seres do mundo a procurar uma identidade nacional para seu trabalho.

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A diferença está na abordagem. Boa parte dos designers são chorões e birrentos, perdendo tempo discutindo em círculos. Cervejeiros simplesmente não estão nem aí – produzem primeiro e perguntam depois. A Colorado (cervejaria de Ribeirão Preto) inovou usando mandioca e café na cerveja. A Dado Bier (gaúcha), com erva-mate. Se ficou bom, ótimo. Se não, até a próxima experiência maluca. É tanto otimismo transbordando que dá dó comparar com nós, designers em crise.

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Veja o seguinte caso: quando nós olhamos um rótulo de cerveja, não encontramos muito mais informações além dos ingredientes e do grau alcóolico. Mas cervejas possuem uma variadade grande de índices, e um deles é o IBU, ou índice de amargor. As pilsens tchecas – as originais (nada a ver com o suco de milho que tomamos aqui) – têm entre 25 e 30 de IBU. Uma Heineken, que consideramos amarga para o nosso paladar, tem 20. Skol, Bohemia, Kaiser e afins não costumam passar de 10. Um maluco carioca que se enquadra perfeitamente no perfil que tracei acima criou uma assombração alcóolica com 150 de IBU e 10,5º – com o sugestivo nome de “Hop Wine” (Vinho de Lúpulo). Foi provar tal líquido fermentado que me fez chegar à conclusão que existe, sim, um estilo brasileiro de fazer cerveja – que se resume na palavra insanidade.

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Esse não é o único comparativo interessante. Uma das cervejas ganhadoras de um concurso anterior foi fervida em uma panela de batata e esfriada na piscina do quintal – mais ou menos como muitos projetos fantásticos (e premiados) de design que vemos por aí foram feitos. Os cervejeiros estão se organizando em associações – a AcervA Nacional (Associação de Cervejeiros Artesanais) e as Regionais. Concursos atrás de concursos têm sido realizado pelo país para divulgar a “arte”. O mercado tem tido um crescimento tão assustador que até as megacervejarias mudaram suas estratégias – enquanto a Schincariol entrou de cabeça nesse mundo, comprando várias microcervejarias e investindo em inovações, a Ambev/Inbev aposta nos rótulos importados que a empresa já têm. Em menos de uma década e de maneira completamente anárquica, os cervejeiros estão fazendo com seu mercado o que os designers lutam desde que a profissão aportou por aqui.

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Fazer uma cerveja em casa não é difícil, mas é trabalhoso: da moagem do malte à passagem para os fermentadores (não raro galões de 20l de água mineral improvisados) passam-se fáceis 12 horas, além de melecar toda a área de serviço da casa e boa parte da cozinha. O custo da brincadeira por litro sai muito mais caro que qualquer cerveja de supermercado – e ninguém estaria nessa se não fosse por paixão. E paixão muitas vezes é também o que faz toda a diferença para os bons e maus profissionais de design.

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Se você ama o que faz, por mais ruim que seu trabalho seja, vai fazer o possível e o impossível para melhorá-lo. Não só pelo esforço, mas simplesmente porque tudo (bem, quase tudo) passa a ser muito divertido. Pense nas 24 horas do dia. Qual o sentido de se dormir 8 horas e fazer o que não gosta durante outras 8 com o objetivo de se fazer o que gosta nas 8 restantes? Ainda não inventaram um jeito prático de se abdicar do sono, então temos 1/3 de toda uma vida sendo jogada pela janela. Dá pra tornar essa vida mais interessante – especialmente com um caneco de Belgian Strong Ale do lado da mesa.

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E viva a invasão dos beer designers!

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(em tempo: nenhum cervejeiro no mundo se autodenomina “beer designer”, mas inventar essa expressão foi uma maneira prática de irritar os pentelhos do design. Se você é um deles, provavelmente está sofrendo de falta de preocupações na vida. Vá fazer um filho)

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Luiz Fernando Pizzani é coordenador geral do Projeto Empreendedorargh!, uma iniciativa de cursos de curta duração, palestras e pesquisas itinerante sobre mercado de trabalho e empreendedorismo em design no Brasil. É formado em desenho industrial – projeto de produto pela PUCPR, pós-graduando em CBA de Gestão de Negócios pela Estação-Ibmec Business School e presta serviços de consultoria para empresas de design recém-formadas ou em fase de formação. É viciado em Strong Golden Ales, Rauchbiers, IPAs, Kölschs, Barley Wines e tomar café da tarde com Fernando Henrique Cardoso, não necessariamente nesta ordem.

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