Design thinking: uma nova abordagem para inovação

Conheci o Luiz Bonini na palestra do Luis Arnal e desde então mantivemos contato. Ele e o Gustavo de Boer escreveram este artigo sobre Design Thinking. Até nada demais. O fato é que eles veem de Administração o que traz, a meu ver um oxigênio novo para o papo que estamos construindo aqui. Eu neste post “O q é? O q é? Design Thinking” e a Denise Eler neste “De que tipo de Design Thinking estamos falando afinal“.

Daqui pra frente transcrevo o artigo na íntegra, mas você pode acessá-lo aqui ou baixar o PDF.

Design thinking: uma nova abordagem para inovação

Diversas empresas têm adotado a visão do design para a condução dos negócios, seja através do desenvolvimento de inovações ou para a resolução de problemas de forma criativa e centrada no usuário. É nesse contexto que surge o conceito de design thinking.


Steve Jobs, CEO da Apple, disse em 1995 para a BusinessWeek: “É difícil desenhar produtos por focus groups¹. Muitas vezes, as pessoas não sabem o que querem até você mostrar para elas” . Em outra oportunidade, Jobs disse: “Design não é somente o que se vê ou o que se sente. Design é como funciona”. É exatamente dessa forma que a Apple conduz os seus negócios, utilizando design como arquitetura não somente de seus produtos, mas do seu modelo de negócio. Nos últimos anos, diversas empresas têm adotado essa visão de design para construção e condução dos negócios. Nesse contexto, surge o conceito de design thinking.

O Conceito

O uso do design para o desenvolvimento de soluções tem sido estudado há mais de trinta anos por diversas escolas de pensamento, como arquitetura, ciências e artes. No entanto, nos últimos anos a sua aplicação se estendeu para uma direção inusitada, os negócios. A origem dessa nova aplicação do design está associada à consultoria IDEO, empresa norte-america que desenvolve inovações com base no pensamento de um designer. Daí a denominação do conceito: design thinking.

Afinal, o que é design thinking? Para Roger Martin, professor na Rotman School of Management e estudioso sobre o tema, design thinking é dar forma a um contexto em vez de tomá-lo como ele é. Ou seja, o conceito lida principalmente com o que ainda não existe. Até aí, qual é a novidade? Os modelos tradicionais de inovação também buscam minimizar riscos daquilo que não existe, assim como garantir que a organização se mova rapidamente em um cenário complexo e altamente sujeito a mudanças de padrões de vida e hábitos de consumo. No entanto, Tim Brown, fundador da IDEO, deixa bem clara a diferença: design thinking é um negócio baseado na prototipagem, uma vez que você não desiste de uma ideia promissora, você a constroi.

É exatamente nesse ponto que muitas empresas falham na construção de modelos de inovação. Estão sempre buscando novos conceitos que vão romper o mercado, mas estruturam processos altamente rígidos na avaliação e seleção – geralmente de ideias e conceitos em estágios ainda prematuros. Enquanto caminham pelo funil da inovação e atravessam os gates, os conceitos são quantificados, avaliados e selecionados, o que torna o funil ainda mais estreito, pois exigem-se respostas que ainda não podem ser dadas. Todo esse processo tende a gerar como resultado, no máximo, melhorias nos produtos existentes, longe da ambição de desenvolvimento de inovações radicais.

O design thinking, por outro lado, foca no desenvolvimento de soluções impecáveis esteticamente e com novas funcionalidades, criando novas experiências, valor e, principalmente, significado para os consumidores. Para isso, é de fundamental importância que a organização inicie o processo de inovação com o foco no consumidor, obtendo as suas impressões sobre produtos, serviços e processos, decifrando as suas ambições em novas soluções. Os gates, neste caso, são formados por prototipagens dos conceitos gerados e testes com o usuário final, mesmo em fases prematuras. O processo deixa de ser um funil e passa a ser um espiral, na qual essas fases evoluem até que o todo se torne viável.

Este artigo pretende explorar as principais características e especificidades do design thinking, buscando o entendimento dos principais pontos que tornam essa nova vertente um modelo único para o desenvolvimento de inovações. Para isso, serão abordados: o processo de criação de oportunidades, o modo como o designer pensa e o formato que se organiza a prototipagem.

CRIANDO OPORTUNIDADES

Desenvolver ideias de alto impacto não é uma tarefa fácil. Atualmente, os principais ativos da empresa são aqueles intangíveis, com grande foco no conhecimento. Traduzi-los em novas oportunidades de gerar negócios é, portanto, o ponto-chave para garantir a sobrevivência das corporações no longo prazo. Nesse contexto, no processo de inovação é de grande importância a definição das premissas iniciais para o desenvolvimento de novas soluções. Assim, o processo de design thinking envolve a formulação das perguntas corretas, como:

  • Para quem é esse produto?
  • Quais são as necessidades e os hábitos das pessoas que podem ser identificados?
  • Quem são os concorrentes?

Todas essas questões podem ser resumidas em uma só sentença: qual é a solução que meus clientes precisam? Segundo Brown, o caminho para conseguir a solução ideal passa por desvendar a necessidade dos clientes avaliando soluções tecnologicamente confiáveis e por uma estratégia de negócio viável; de modo a converter em valor para o consumidor e em oportunidade de mercado para a empresa.

Fonte: http://www.ideo.com/thinking/approach/

A criação de oportunidades se inicia por meio do desenvolvimento de um briefing, uma ideia do que se pretende. Em 2004, quando o Bank of America contratou a IDEO, o briefing passado foi: descobrir um modo para que as mulheres da geração baby boom (período marcado pelo alto índice de natalidade, pós Segunda Guerra Mundial) abrissem novas contas e poupanças.

Após o briefing, uma equipe multidisciplinar inicia os estudos do comportamento desse consumidor, buscando constatações de comportamento, necessidades e características do público-alvo. O comportamento é observado acompanhando o dia-a-dia dessas pessoas, com documentação das características, sejam por fotos, vídeos, relatórios ou depoimentos, gerando hipóteses ou insights. O objetivo da fase inicial é gerar o maior número possível de insights.

“O Design Thinking pode identificar um aspecto de comportamento humano, e depois convertê-lo em benefícios para o consumidor, além de adicionar valor ao negócio.”
Tim Brown

Uma das premissas dessa técnica é o levantamento de impressões daqueles que são heavy users do produto em estudo, assim como dos que não costumam ter nenhum contato. O principal objetivo é agregar visões diversificadas, tanto de pessoas que possuem alto envolvimento com a marca como daquelas que não o tem.

COMO O DESIGNER PENSA?

Entender o método que o designer utiliza para a construção de soluções pode gerar insights valiosos para o mundo dos negócios. Nesse contexto, estudiosos têm se dedicado para decifrar os seus segredos.

Segundo Roger Martin, o design thinking promove o equilíbrio entre o pensamento analítico e o intuitivo, o que permite às organizações gerar inovações para aumentar a eficiência e competitividade. Em essência, o design thinking permite que as corporações passem do complexo ao simples, do mistério para o algoritmo por meio do que ele se refere como o “funil” do conhecimento.

Fonte: MARTIN (2009), “The design of business: why design thinking is the next competitive advantage”

Além disso, Martin indica que o design thinking é possível usando a lógica abdutiva, conceito desenvolvido originalmente por James Peirce. O pensamento abdutivo permite que design thinkers explorem possibilidades olhando para o futuro, enquanto ainda analisam oportunidades olhando para o passado.

“A abdução é o processo para formar hipóteses explicativas. A dedução prova algo que deve ser, a indução mostra algo que atualmente é operatório, já a abdução faz uma mera sugestão de algo que pode ser.  Para apreender ou compreender os fenômenos, só a abdução pode funcionar como método. O raciocínio abdutivo são as hipóteses que formulamos antes da confirmação (ou negação) do caso”.
Peirce (1975)

A PROTOTIPAGEM

O design thinking trabalha intensamente a criação de oportunidades, ou melhor, hipóteses, que são resultado de sessões de criatividade que criam e reciclam o conhecimento gerado pela prototipagem. Os protótipos desenvolvidos têm como objetivo ir além dos pressupostos que bloqueiam soluções eficazes e realmente inovadoras. Para isso, as hipóteses são trabalhadas e ganham forma sob o rápido desenvolvimento de protótipos, despendendo-se somente o tempo, investimento e esforços necessários para gerar informações úteis para evoluir o desenvolvimento da ideia.

Esses protótipos podem ser desenvolvidos de diferentes formas, seja como modelos pouco sofisticados, como caixas de remédio com fita crepe, histórias em quadrinhos e interpretações, ou sob formas mais elaboradas.

O principal resultado desse processo não é a minimização de riscos e o levantamento do potencial de lucratividade do protótipo em si, como nos modelos tradicionais, mas o aprendizado sobre os pontos fortes e fracos da ideia, além da identificação de novos rumos para esse protótipo. Tim Brown diz que a prototipagem é mais um dos estágios da criação e concepção da ideia. Nos estágios iniciais, ela é importante para gerar ideias, invertendo o pensamento tradicional de imaginar para criar, trazendo à tona a lógica de criar para visualizar e imaginar novas alternativas e soluções.

Todo o processo inicial está baseado na ideia de criar oportunidades e soluções (pensamento divergente) para somente depois começar a trabalhar na escolha das melhores soluções (pensamento convergente).

Adaptado de BROWN (2009), “Change by Design”

No caso do Bank of America, alguns dos comportamentos observados foram:

  • As consumidoras acumulavam trocados em casa e depois os depositavam no banco;
  • Para as mães, o ato de poupar é algo emocional ligado ao sentimento de garantir o futuro de seus filhos;
  • O impulso de comprar supera a vontade de poupar;
  • Técnicas de poupar não são bem suportadas pelo banco, em geral tem linguagem muito técnica e complicada: conseguir crédito é mais simples que poupar;
  • Uma solução observada diversas vezes foi a de “arredondar para cima” contas e compras, com o objetivo de facilitar a contabilidade.

Estes comportamentos geraram diversos insights e soluções que foram prototipadas, testadas, abortadas e aprimoradas, gerando também aprendizados para o enriquecimento de outras ideias. A estratégia era a de criar um meio criativo de dar poder às mães para economizar por meio de novos produtos bancários. Soluções propostas apontavam para criar novos pontos de contato do banco com o consumidor, dar mobilidade e portabilidade à instituição, estreitando a relação e criando um vínculo afetivo para o serviço.

O projeto, por fim, criou uma solução que foi resultado do aprendizado de diversos conceitos, testados e prototipados em um produto único: o Keep the Change. A inovação resultou no ganho de 2,5 milhões de novos clientes em um ano com um conceito simples: ao realizar uma compra por meio do cartão, automaticamente as contas são arredondadas para cima e a diferença é automaticamente depositada em uma conta de investimento.

Fonte: www.bankofamerica.com

CONCLUSÃO

Com uma nova abordagem, o design thinking é uma poderosa ferramenta que engloba todo o processo de inovação, desde a geração de ideias à inserção de mercado. Possui uma visão otimista, construtiva e experimental, focada na solução de necessidades dos consumidores com relação a produtos ou serviços e à sua arquitetura.

Suas principais contribuições se referem:

  • Ao modo como é abordado o problema, por meio do levantamento das questões-chave que guiarão o processo de criação de oportunidades desejáveis ao consumidor, tecnicamente possíveis e mercadologicamente viáveis;
  • Ao modo que um designer pensa, por meio da criação de hipóteses e utilização do conhecimento para desenvolver soluções eficazes;
  • À busca contínua por soluções específicas e focadas no usuário;
  • À rápida prototipagem e materialização da solução desenhada, de modo a criar muitas oportunidades e selecionar aquelas de maior impacto.

As empresas têm adotado o design thinking pelos resultados inovadores, a possibilidade de diferenciação de suas marcas e pela velocidade com que é capaz de colocar novos produtos e serviços no mercado, uma vez que todo o processo é conduzido envolvendo diretamente os consumidores, testando e validando cada fase do desenvolvimento.

Entretanto, a condução desses projetos exige expertise e competências muito específicas, o que ainda dificulta a condução por áreas internas das empresas em seu dia-a-dia.

BIBLIOGRAFIA

BROWN, Tim. Change by Design: how design thinking transforms organizations and inspires innovation. HarperCollins, New York, 2009.
BROWN, Tim. Design Thinking, 2008. Disponível em: <http://www.ideo.com/images/uploads/news/pdfs/IDEO_HBR_Design_Thinking.pdf> Acesso em: 20 mai. 2010, 02:05.
KELLEY, Tom. Prototyping is the Shorthand of Design. Design Management Journal Vol. 12, No. 3.
MARTIN, R. L. The design of business: why design thinking is the next competitive advantage. Boston, Mass., Harvard Business Press, 2009.
PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica e filosofia. São Paulo, Cultrix, Editora Universidade de São Paulo, 1975.

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