Folha de S. Paulo – Raquel Cozer
As mais recentes galerias criadas pelo colecionador inglês Charles Saatchi, considerado o responsável pelo “boom” da arte britânica nos anos 90, recebem, juntas, 3,5 milhões de visitas por dia -contra uma média de 20 mil pessoas que passam diariamente pelo Louvre, na França.
Elas foram abertas entre abril e novembro do ano passado e existem apenas virtualmente, em duas redes de relacionamento do site da Saatchi Gallery (www.saatchi-gallery.co.uk), com pinturas, vÃdeos e outras obras de artistas pouco ou nada conhecidos.
A maior dessas redes é o Your Gallery, dedicado a amadores e profissionais, que tem hoje 23 mil usuários e um filhote, o Stuart (abreviação de “student of art”), freqüentado por 3.000 estudantes de artes.
Ambas têm um quê de Orkut ou MySpace, mas, para entrar nelas, é preciso ser artista – ou pelo menos aspirante. Embora o usuário possa se cadastrar sem divulgar nenhuma obra, seu nome só fica visÃvel para os outros quando ele publica a imagem de alguma criação sua.
Para Kieran McCann, diretor de desenvolvimento criativo da Saatchi Gallery, qualquer semelhança com o MySpace é coincidência – o Stuart tem inclusive link para adicionar amigos e espaço para comentários. “Nossas redes têm apenas artistas. Não há nada assim no mundo”, diz McCann à Folha.
O grande diferencial mesmo, no entanto, é o fato de as redes servirem como vitrine. A maioria dos usuários as vêem como um espaço para vender obras. Nem todos sabem quem é esse padrinho que manda um genérico e-mail de boas-vindas aos novatos, mas, entre os que sabem, difÃcil é quem não sonhe em cair nas graças de Saatchi, que já descobriu artistas como Damien Hirst e Tracey Emin.
A galeria aproveita o marketing em torno do nome do milionário para engordar a lista de usuários. Ao lançar o Your Gallery, Saatchi disse, em comunicado, que não interferiria no site “por um ano” -dando a entender que, passado o prazo, qualquer um ali poderia virar uma estrela da noite para o dia.
“Há obras fascinantes, e existe o potencial de o sr. Saatchi se envolver com algumas quando abrirmos nossa nova galeria, em Chelsea, neste ano. Ele vê as obras de cada perfil aberto nas redes”, diz McCann. Ã? impossÃvel saber ao certo se Charles Saatchi realmente se dedica ou não a tais visitas incansáveis pelos perfis. Em meio a tanta concorrência, a chance de um artista atrair um colecionador, curador ou dono de galeria é pequena.
Sem intermediários
O site não cobra taxa de inscrição nem comissão por venda de obra. “As vendas acontecem diretamente entre o artista e o colecionador. Só ficamos sabendo, eventualmente, quando o artista nos escreve em agradecimento”, diz McCann.
A possibilidade de eliminar o intermédio de marchands é, para McCann, o maior feito das galerias virtuais. “O que Saatchi fez foi abrir uma galeria para o mundo inteiro. Acreditamos que esse seja o futuro da arte, a forma como ela passará a ser negociada nos anos vindouros.”
Embrionária, a proposta tem rendido outros frutos. O jornal inglês “The Guardian” promoveu em outubro uma mostra -de verdade- com obras de artistas do site, selecionados por crÃticos e leitores. Neste mês, a “The Gallery @ Adventure Ecology” reunirá obras que tratam de temas ligados ao ambiente. Prova ao menos de que a meta de quem expõe nas galerias virtuais ainda é chegar à s boas e velhas galerias reais.