Dia desses um amigo se surpreendeu com o fato de todas as minhas aulas estarem disponíveis no meu site, com transparências, bibliografia e tudo mais, para quem quisesse. Um professor também me perguntou se eu iria colocar o texto completo da minha tese na Internet (alertou-me de que alguém poderia copiá-lo). Resposta para as duas questões: tomara que me copiem mesmo! O mundo inteiro está na Internet, não há segredo que possa se gabar de estar em segurança. E isso não faz mesmo nenhum sentido. Para que esconder e guardar informações? Principalmente, se a gente considerar que o objetivo é divulgá-las e compartilhá-las com o máximo de pessoas possível.
Houve um tempo em que as pessoas acreditavam que seu talento e valor residiam no que só elas sabiam, naquilo que guardavam trancado a chave na gaveta do escritório. Tinham a ilusão de que a seção, o departamento, a empresa, o mundo, tudo pararia se ela se recusasse a abrir a gaveta. A garantia do seu emprego estava lá dentro, guardadinha.
Ainda bem que o mundo mudou (se bem que algumas poucas pessoas ainda não perceberam). Hoje as empresas não contratam mais quem não sabe trabalhar em equipe e tem o nefasto hábito de trancar gavetas. Na época pré-Internet, talvez até essa pudesse ser uma estratégia válida de sobrevivência, inclusive muito popular.
Hoje não há mais gavetas trancadas em nenhum lugar do mundo. Pelo menos não para sempre. E as pessoas têm que pensar em outra maneira de se fazerem importantes no seu ambiente de trabalho em particular e na vida de uma maneira geral. Segredos não estão mais seguros e podem ser devassados a qualquer momento. Então, o que fazer?
Primeiro: reconhecer que a gente não sabe quase nada do que há para saber. Mesmo que eu publique aqui tudo o que sei, ainda assim é muito pouco para me fazer de importante e garantir minha sobrevivência profissional em algum lugar. Tudo o que está aqui também está ao mesmo tempo em muitos outros lugares, talvez com uma roupinha diferente. Sabe por quê? Por que são só informações e a gente vive mergulhado nelas, praticamente afogados. Conhecimento não é mais diferencial de nada, está ao alcance de qualquer um que tenha oportunidade e persistência para achar o que quer.
Segundo: reconhecer que sozinho não se vai a lugar nenhum. Se o que a gente sabe é quase nada, então como fazer alguma coisa com isso? Ora, o óbvio. Juntar com o pouquinho que mais alguém sabe e voilá: pode ser que se crie algo realmente útil e até importante. Já que é impossível para um só dar conta de saber tudo o que é preciso para andar pra frente, só nos resta montar o quebra-cabeças. Assim, quanto mais gente inteligente e disposta a compartilhar informações a gente conhece, maior é a probabilidade de realizar um trabalho legal que faça diferença.
Terceiro: o importante não é tanto o saber fazer, mas saber o que fazer. Ou seja, não adianta falar línguas, ter diplomas, teses, cursos e outros enfeites curriculares, se você não souber o que quer fazer com tudo isso. Vejo gente que estudou um montão reclamando que não há emprego, que ganha mal, e que fulano de tal que tem apenas o segundo grau incompleto está ganhando rios de dinheiro. Ora, a inteligência e a competência independem de quanto cada um estudou. Tem mais a ver com a sua visão do mundo, com a capacidade de criar novas soluções para velhos problemas, identificar oportunidades, gostar de desafios, ir à luta. Se a pessoa não sabe o que quer fazer com tudo o que aprendeu, isso acaba virando um fardo, um peso para carregar. Assim, quanto mais se estuda e aprende, mais elementos se tem para criar e mudar, o que, sem dúvida, é uma vantagem — mas vale lembrar que pode ser mais útil um simples canivete para quem sabe usá-lo do que mísseis supersônicos para quem não tem idéia do seu alvo.
Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br