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Deus-igners, especulações e outras coisas perigosas…

Faculdades ensinam conceitos de design que não tem nenhuma comprovação, e não são questionadas por isso.
— “Usei a cor amarela no logo pois pesquisas mostram que essa cor dá fome. Prova disso é que o McDonald´s usa essa cor.”
Chute.
— “Usei o azul pois é uma cor que transmite confiança.”
Outro chute.
— “Coloquei o título em cima pois tudo o que fica em cima tem mais importância, afinal, os olhos sempre vêem a página de cima pra baixo, da esquerda pra direita.”
Mais um chute. E sem fazer gol.
É impressionante a quantidade de argumentos usados por alguns designers, diretores de arte e outros profissionais, que afirmam ter base para justificar suas escolhas. O “profissional” finge que entende o que faz. O cliente finge que acredita. Mas o consumidor não finge que compra e o usuário não finge que aceita.

De onde vem tudo isso?

Parte desse comportamento começa em algumas faculdades de Design. Ano após ano professores continuam repetindo aquilo que aprenderam quando eram alunos e que, só porque foi dito numa faculdade, ganhou status de “verdade absoluta”. “Ah, mas foi o professor quem falou!”. Está garantida então a continuidade dos achismos e especulações, que ninguém ousa criticar, ora porque ache que tudo que se ensine nas faculdades seja verdade ou porque não tenha outra referência para comparar e perceber a besteira que está sendo dita.

Os mitos se perpetuam

O resultado? Milhares e milhares de alunos saem repetindo ensinamentos ditos “verdadeiros” que não passaram por nenhuma validação e que não sobrevivem ao primeiro “mas você tem certeza disso?”.

Muitos designers saem repetindo fórmulas prontas do tipo:

  • “letras serifadas são mais fáceis de ler do que letras sem serifa, em textos longos”
  • “o olho vê a página num movimento diagonal do canto superior esquerdo para o canto inferior direito”
  • “a cor vermelha chama mais a atenção”
  • “o tamanho mínimo ideal de texto é corpo 10 a 12”
  • “a melhor resolução para impressão de imagens é 300 dpi”

(pra quem se interessa em saber porque isso são mitos, as referências estão citadas no fim deste artigo)

Mas a regra mais importante não é ensinada. Aquela que diz que “tudo depende”. Todas essas afirmações citadas são questionáveis e carecem de fundamento.

Por que fazemos vista grossa?

Mas admitir essa falha significa também admitir que todas aquelas justificativas dadas pelos designers aos clientes, pelos alunos aos professores, pelos professores aos alunos, na verdade não passam de pura especulação, mera suposição.

Quais as consequências? Imagine se anestesistas dissessem para cirurgiões: “eu acho que a paciente aguenta 500 ml disso”. Ou se um dentista dissesse para o paciente que não tem certeza, mas acha que é melhor arrancar todos os dentes. Enfim, se apoiar em mero achismo gera insegurança e falta de confiança no profissional. Afinal, ele é pago para ter segurança no que diz, e não demonstrar incerteza.

Toda vez que um designer vai tentar justificar uma decisão e não consegue, o cliente fica convencido que tudo não passa de intuição, gosto pessoal. E gosto por gosto, o cliente prefere ficar com o dele próprio, pois ele não vai confiar os rumos do seu negócio numa decisão que mais parece uni-du-ni-tê do que uma escolha com base sólida.

Eu sou o senhor do conhecimento

Muitos designers podem pensar que eles tem mais capacidade que um cliente para decidir pois:

  • são formados numa faculdade
  • leram um livro sobre o assunto
  • tem mais experiência para decidir
  • possuem um “feeling” para a coisa
  • receberam um dom de Deus.

Só que:

  • o fato de ter sido ensinado numa faculdade não é garantia de que o conhecimento é válido,
  • estar escrito em um livro também não é certificado de validade,
  • a experiência do designer não é prova de que os casos que ele vivenciou se aplicam a tudo e possam ser generalizados,
  • basear-se em “feeling” (intuição) é pura especulação e em muitos casos é apenas uma desculpa para se colocar numa posição superior aos outros, alegando ter uma capacidade especial que poucos têm, um talento dado por Deus.

Ainda existe a cultura de que os designers, arquitetos, diretores de arte, tem uma capacidade especial, quase mística, de gerar soluções ideais, sem precisar justificar suas decisões. Essa é a visão do designer autoral, aquela pessoa que assina sozinha um projeto inteiro. Num trabalho em equipe, como a multimídia e o cinema, esse modelo está em desuso. Em ambientes multidisciplinares, com profissionais de diferentes competências, a postura do designer-deus se torna um problema e dá margem para conflitos.

O designer seria muito beneficiado se não aceitasse prontamente qualquer “vento de ensino” e procurasse ter uma visão crítica a respeito daquilo que é considerado “verdade” mas se configura como mera repetição da repetição da repetição de algo que se ouviu dizer que alguém falou.

O que fazer?

Algo que pode ser útil como ponto de partida para esse questionamento, é o que o gestaltismo prega quando diz que “o todo é mais que a soma das partes” ou que “se uma parte muda, a percepção do todo pode se modificar”. Em poucas palavras, isso quer dizer que muitas regras ensinadas nas universidades não valem para TODAS as situações, pois a mudança de um único detalhe pode implicar em mudanças no quadro geral.

Dizer que pontos vermelhos chamam a atenção e transformar isso em regra, por exemplo, desconsidera um princípio geral: “TUDO DEPENDE”. Um ponto vermelho chama a atenção num fundo branco. Mas e se o fundo também for vermelho? E se o fundo for preto? E se isso for visto de noite, sob a chuva forte? Depende, tudo depende.

Portanto, abrir os olhos e não aceitar prontamente tudo que nos ensinam pode gerar um movimento positivo a favor do aprimoramento do design. Na medicina, muitos precisaram morrer para que médicos questionassem alguns mitos. No design não é diferente. Enquanto não procurarmos fundamentos sólidos nos quais apoiar nossas escolhas e argumentos, alunos continuarão sem entender porque tiraram zero, clientes continuarão com dificuldades para confiar em nós e, não menos importante, o design demorará a alcançar o respeito que a profissão merece.

PS: Vale a pena ler o post do Luiz Pizzani a respeito do Pop-Design, é divertido e esclarecedor.

Referências (a pedidos ;))

Se você quiser formar uma opinião sobre os tais mitos, consulte a bibliografia apontada a seguir:

Mito 1 – “letras serifadas são mais fáceis de ler do que letras sem serifa, em textos longos”

  1. Arditi, A. e J. Cho. Serifs and font legibility. Vision Research, v.45, n.2005. 2005.
  2. Kinross, R. Modern typography: An essay in critical theory. London: Hyphen Press. 1992
  3. Kostelnick, C. The rhetoric of text design in professional communication. The Technical Writing Teacher, v.17, n.3, p.189-202. 1990.
  4. Lund, O. Knowledge Construction in Typography: the Case of Legibility Research and the Legibility of Sans Serif Typefaces. Teses de doutorado não-publicada, Department of Typography & Graphic Communication, The University of Reading. 1999.
  5. Schriver, K. A. Dynamics in document design: John Wiley & Sons. 1997
  6. Tinker, M. A. Legibility of print: Iowa State University Press, Ames. 1963
  7. Warde, B. The Crystal Goblet: Sixteen Essays on Typography: World Pub. Co. 1956
  8. Watts, L. e J. Nisbet. Legibility in children’s books: a review of research. Windsor: NFER Publishing Company, Ltd. 1974
  9. Wheildon, C., Ed. Type and layout: How typography and design can get in your message across – or get in the way. Berkeley: Strathmoored. 1996.
  10. Wrolstad, M. Methods of research into legibility and intelligibility. In: J. Dreyfus e R. Murat (Ed.). Typographic Opportunities in the Computer Age. Prague: Typografia, 1970. Methods of research into legibility and intelligibility, p.36-41

Mito 2 – “o olho vê a página num movimento diagonal do canto superior esquerdo para o canto inferior direito”

  1. Barry, A. Visual Inteligence: Perception, Image and Manipulation in Visual Communication. Albany: State University of New York. 1997
  2. Hoffman, D. Visual Inteligence: How We Create What We See. New York: Norton & Company. 1998
  3. Kostelnick, C. The rhetoric of text design in professional communication. The Technical Writing Teacher, v.17, n.3, p.189-202. 1990.
  4. Netto, J. T. Semiótica, Informação e Comunicação. São Paulo: Perspectiva. 1999
  5. Schriver, K. A. Dynamics in document design: John Wiley & Sons. 1997
  6. Siqueira, N. Laboratório da Forma. Dissertação de Mestrado não-publicada, Departamento de Artes Visuais do Instituto de Artes da UnB. Brasília, 2006.
  7. SMITH, F. Compreendendo a leitura. Porto Alegre: Artes Médicas. 2003
  8. Tiski-Franckowiak, I. Homem, Comunicação e Cor. São Paulo: Ícone. 2000
  9. Wong, W. Princípios de forma e desenho. São Paulo: Martins Fontes. 1998

Mito 3 – “a cor vermelha chama mais a atenção”

Leia a explicação completa.

Mito 4 – “o tamanho mínimo ideal de texto é corpo 10 a 12”

  1. Elements of Typographic Style. Elements of Typographic Style: Hartley & Marks Publishers. 1992
  2. Frascara, J. Optometry, legibility and readability in information design. Information Design International Conference 2003. Recife: SBDI 2003.
  3. Iida, I. Ergonomia: Projeto e Produção. 1997 (São Paulo: Edgard Blücher)
  4. Lupton, E. Thinking with type: a critical guide for designers, writers, editors, & students: New York: Princeton Architectural Press. 2004

Mito 5 – “a resolução correta para imagens de alta qualidade é no mínimo 300 dpi”

  1. Barry, A. Visual Inteligence: Perception, Image and Manipulation in Visual Communication. Albany: State University of New York. 1997
  2. Frascara, J. Optometry, legibility and readability in information design. Information Design International Conference 2003. Recife: SBDI 2003.
  3. Hoffman, D. Visual Inteligence: How We Create What We See. New York: Norton & Company. 1998
  4. Iida, I. Ergonomia: Projeto e Produção. 1997 (São Paulo: Edgard Blücher)
  5. Marin, J. e J. Shaffer. The PDF Print Production Guide. Graphic Arts Technical Foundation, Sewickley, Pennsylvania, v.257.
  6. Peduzzi, K. But Will It Print?: Prepress File Requirements Every Graphic Designer Must Know But Won’t Learn in School: BookSurge Publishing. 2006
  7. Pender, K. Digital colour in graphic design: Focal Press Boston. 1998
  8. Pipes, A. Production for Graphic Designers: Laurence King Publishing. 2005

Publicado por Ricardo Martins

Ricardo Martins é professor de tipografia, metodologia visual, projeto de embalagens e design avançado de identidade visual da Universidade Federal do Paraná. Além de professor na UFPR, atua como designer gráfico freelancer desde 1993. É diretor institucional da ProDesignPR (www.prodesignpr.com.br), membro do Type Directors Club de Nova Iorque (EUA), da Sociedade Brasileira de Design da Informação (SBDI) e do Communication Research Institute, em Melbourne (Australia).

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