All posts by Lígia Fascioni

Lígia Fascioni é engenheira eletricista, especialista em marketing, mestre em automação e controle industrial e doutora em engenharia de produção na área de gestão integrada do design. Publicou "Quem sua empresa pensa que é?" (2006), "O design do designer"(2007), "Atitude profissional: dicas para quem está começando" (2009) e "DNA Empresarial" (2010). Atua como consultora empresarial e palestrante. Ministra disciplinas em cursos de graduação e pós-graduação (MBA) em marketing, inovação e design. Mantém o site www.ligiafascioni.com.br e www.atitudepro.com.br. É colunista do portal Acontecendoaqui.com.br e colabora com diversos sites e blogs sobre marketing e design.

Muito barulho por nada

Fotografia: Steve Peixotto e Ross Brown

Está rolando uma polêmica na internet por causa de um site, veiculado na imprensa como inovador, no qual o cliente decide quanto quer pagar por uma marca gráfica. Designers (ou não) postam suas propostas e ele escolhe a que acha melhor, numa espécie de leilão ao contrário (o cliente define o preço e os profissionais disputam os projetos).

Pois as comunidades de design estão cheias de gente espumando de raiva, inconformados com o modelo de negócio. Alegam que design é coisa séria demais para ser vendido num feirão, sem nenhum critério, desvalorizando o conhecimento que o profissional deve ter para fazer um trabalho bem feito.

Bom, vamos analisar primeiro a inovação do serviço. Na verdade, o modelo sempre existiu. Não é de agora que o cliente decide quanto quer pagar e o que quer comprar. O que o site fez foi organizar essa forma de trabalho, colocando as partes em contato direto. E, que fique claro, todas as partes envolvidas são maiores de idade e estão lá por livre e espontânea vontade.

Muita gente alega que isso é prostituição da profissão. Ok, e daí? O que há de errado com a prostituição? Há prostitutas que fazem ponto na esquina, bem baratinhas, e há as de luxo, que falam línguas e acompanham executivos. De fato, o cliente escolhe o serviço que quer de acordo com o orçamento disponível. Ele paga por aquilo que tem valor para ele. E ponto.

Acompanhei discussões onde alguns profissionais estavam preocupados com banalização do processo de elaboração de marcas gráficas. Ora, se os clientes acham que qualquer um pode fazer uma marca, a culpa é deles? Na minha opinião, a culpa é dos designers mesmo. Se alguém compara duas opções muito diferentes em pé de igualdade, é porque quem fez o trabalho mais elaborado (e caro), não conseguiu deixar clara a diferença. E isso é responsabilidade do designer e de ninguém mais.

Será que as grandes empresas de design estão perdendo o sono por causa desse site? Acredito que não, justamente porque conseguem deixar claro para seus clientes que uma marca gráfica não é só um desenho; há muito trabalho por trás, há estratégia, há planejamento, há conceito. Não pode ser feito por qualquer um, dá mais retorno ao negócio, VALE MAIS. Mas tem muito designer aí que só entrega um desenho mesmo. Então, tem mais é que arrancar os cabelos de preocupação (se é que já não estava careca, pois o mercado está assim selvagem não é de hoje).

Alguém aí já comprou um sofá numa daquelas lojas de móveis populares? São feios, mal-acabados, ergonomicamente desastrosos, mas baratos. Já vi mais de uma pessoa ficar feliz da vida com a aquisição. Quem sou eu para dizer que o sofá não presta? Penso que funciona da mesma maneira para qualquer serviço – se quem comprou ficou satisfeito, não há mais nada a discutir. Não adianta eu convencer o sujeito que  um sofá projetado por Charles e Ray Eames é infinitamente superior. Para ele, aquele está bom que chega, muito melhor sintonizado com a sua realidade e seu gosto. Como alguém ousa dizer que o sujeito está errado?

Penso ser muita prepotência decidir o que é melhor para os outros; o que eles devem consumir, a quem devem contratar. Quantos designers por aí contratam técnicos eletricistas com carteirinha do CREA para instalar o chuveiro? Teoricamente eles são melhores, mais confiáveis. E olha que, nesse caso, estamos falando de sua segurança pessoal – você pode morrer eletrocutado se o sujeito fizer bobagem. Mas os designers estão errados se contratam o seu Zé da Esquina? Penso que não. O cliente decide o quanto quer pagar e SEMPRE tem consciência de que o que vai receber em troca é proporcional a isso. Fato.

Quer sair fora dessa bagunça? Mostre a diferença, faça-se desejado. Leve a palavra inovação realmente a sério. Lembre-se de que o que é mais raro, é mais caro. O que tem em todo lugar, só pode ser baratinho. Ofereça algo a mais, que seja percebido como importante e essencial pelo cliente. Aprimore sua comunicação. Ouça mais, apure os sentidos. Concentre-se em entregar valor. O pessoal do feirão está todo oferecendo mais do mesmo – você realmente quer competir com eles?

A Starbucks não se preocupa se na esquina da sua loja tem uma padaria vendendo cafezinho por um quinto do preço. E os designers sabem exatamente o porquê dessa tranquilidade. Ou deveriam saber. E se não sabem, como querem oferecer mais que desenhos para seus clientes?

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Será que você é um iconoclasta?

Perguntinha capciosa essa, heim? Vou dar uma pista, afinal, até alguns dias atrás, eu nem fazia ideia se isso era de comer ou de beber.

Vamos lá: iconoclasta, significa, literalmente, destruidor de ícones. A origem da palavra data de 725 d.C., quando Leo II, imperador de Constantinopla, destruiu o ícone dourado de Cristo instalado nos portões de seu palácio. O iconoclasta não respeita símbolos, ídolos, imagens religiosas ou qualquer tipo de convenção social ou tradição. Um iconoclasta entende que nada nem ninguém é digno de culto ou reverência.

Quem desenterrou isso lá das antigas e trouxe para o nosso mundinho contemporâneo foi o neurocientista Gregory Berns, com seu ótimo livro “O iconoclasta”.

Berns atualiza o conceito quando diz que iconoclasta é uma pessoa incomum que interpreta a realidade de maneira distinta e faz aquilo que o senso comum julga impossível de ser feito. Ou seja, iconoclastas são inovadores, aquela raça que muda o mundo e vira pelo avesso tudo o que a gente conhece. Nem sempre esse povo é fácil de lidar, mas são eles que fazem a civilização andar.

Os iconoclastas são pessoas diferentes da média e vêem o mundo de uma maneira diversa e original. Gregory Berns descobriu, inclusive, que o cérebro dessas pessoas é diferente em três aspectos principais: a percepção, a resposta ao medo e a inteligência social.

1. Percepção

Os iconoclastas percebem o mundo de um jeito que as outras pessoas não costumam sequer imaginar. A explicação para isso é que o cérebro tem um gasto fixo de energia e não pode dispender mais quando tem que executar uma tarefa mais complicada. Para resolver isso, nossa massa cinzenta tem alguns truques que a fazem ficar mais eficiente: um deles é rotular tudo o que lhe aparece pela frente, num esquema chamado categorização preditiva (um jeito científico de denominar preconceito).

A coisa funciona da seguinte maneira: para não ficar saturado de informações, o cérebro infere o que está vendo, ou seja, ele avista apenas uma parte da cena e logo murmura: “ah, isso aqui eu já conheço, é um cavalo marinho plantando bananeira“. Assim, nossos miolos escolhem algumas partes que acham mais interessantes e ignoram o resto. Isso economiza energia e funciona muito bem no dia-a-dia, mas destroi, sem dó nem piedade, toda nossa imaginação e capacidade criativa.

Então, uma das maneiras de driblar o sr. Preguiça de Pensar é confrontar o sistema perceptivo com algo que ele não sabe como interpretar, pois nunca viu nada parecido antes. Isso força o descarte das categorias usuais e a criação de novas.

Dr. Berns recomenda viagens como uma ótima oportunidade de apresentar coisas inusitadas para nosso cérebro e recomenda que conhecer novas pessoas, ideias, sabores, imagens, línguas, palavras e hábitos diferentes dos nossos ajuda muito a desestabilizar padrões estabelecidos de percepção (e desconstruir preconceitos confortáveis).

Aliás, Gregory alerta para o fato de que quanto mais a gente tenta pensar de forma diferente, mais rígidas se tornam as categorias estatísticas instaladas na nossa caixola. O único jeito de domar a coisa é justamente bombardeando a teimosa com experiências inéditas.

Os iconoclastas adoram abastecer seus cérebros famintos de novidades e não costumam categorizar o que vêem. Por isso, eles conseguem perceber o mundo sem cair na tentação de rotular as coisas. É assim que eles descobrem novas metáforas, funções, ideias e, em última instância, inovam.

2. Resposta ao medo

O medo faz com que a gente se sinta mal, inseguro, assustado. Ele distorce nossa percepção, nos paralisa e nos impede de criar.

Todo ser humano responde praticamente da mesma maneira quando submetido a uma situação de estresse: a pressão sanguínea sobe e o coração dispara; a boca seca e a gente começa a suar; os dedos tremem, a voz oscila e tem quem sinta até tontura.

Os neurocientistas identificaram 3 tipos básicos de medo: o do desconhecido, o de fracassar e o de parecer idiota. Os iconoclastas também sentem medo, mas, diferentes da plebe, conseguem evitar que sua percepção seja distorcida; como eles pensam diferente e experimentam outros pontos de vista, a coisa toda fica menos aterrorizante. Sempre é possível encontrar uma solução, uma esperança, ou outra maneira de encarar o risco.

Olha só essa frase de Henry Ford, um dos maiores iconoclastas de todos os tempos:

“Quem teme o futuro, quem teme o fracasso, limita suas atividades. O fracasso é somente a oportunidade de começar de novo, com inteligência redobrada. Não há vergonha em um fracasso honesto; há em temer fracassar”.

3. Inteligência social

Muita gente boa, criativa e destemida, já se deu mal por causa da incapacidade de vender suas ideias para os outros. Os iconoclastas bem-sucedidos não, pois eles têm esse talento muito bem desenvolvido. É basicamente esse último aspecto que diferencia a história de umVan Gogh (que morreu sozinho, na miséria) e um Pablo Picasso (seus bens foram avaliados em U$ 750 milhões quando morreu, em 1973).

Berns explica que, para vender uma ideia, o iconoclasta precisa desenvolver duas coisas: a familiaridade e a reputação positiva. A familiaridade é estabelecida pela produtividade e pela exposição; com uma boa rede de contatos a pessoa se torna conhecida tanto pelo seu trabalho como pela capacidade de impactar grupos sociais com suas opiniões.

Iconoclastas bem-sucedidos, como Picasso, são como um nó de rede; tanto influenciam grupos como os conectam. Van Gogh, apesar de brilhante, tinha uma produtividade baixa e um número ainda menor de amigos ou conhecidos. Era um gênio isolado, receita certa para a arte incompreendida e iconoclastia desperdiçada.

A construção de uma boa reputação faz com que as pessoas se acostumem com as ideias do iconoclasta em questão, fazendo com que pareçam menos assustadoras e arriscadas. Para que o iconoclasta consiga de fato vender suas ideias e mudar o mundo, é preciso se fazer confiável.

***

Gregory Berns discorre sobre vários casos de iconoclastas desconhecidos do povão e outros que se tornaram celebridades, como Steve Jobs.

A grande ironia da coisa toda é que, de tão talentosos e especiais, essas pessoas conseguem o impensável: de iconoclastas, eles se transformam em ícones, verdadeiros objetos de culto para seus fãs.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Arte o ano todo

Oportunidade única para designers gráficos, fotógrafos, ilustradores ou qualquer um que queira mostrar o seu trabalho: clique aqui para saber como mostrar o que você é capaz de criar. Você se inscreve e os melhores projetos serão plotados em grande formato e expostos na lateral do prédio da Templuz, em Belo Horizonte. A loja fica numa avenida bem movimentada e o painel tem 32 m x 29 m, vai ficar show!

Cada uma das 12 obras selecionadas ficará exposta por um mês. Um ano inteirinho de arte na rua. Como não amar?

Meditações sobre design

Fotografia: Ahndraya Parlato

Se tem alguma coisa que admiro é a capacidade que algumas pessoas têm de cunhar frases que conseguem sintetizar um mundo de idéias em poucas palavras. Oscar Wilde é um dos meus preferidos, o cara era um gênio mesmo. Há várias compilações muito boas que vão da clássica coleção sempre reeditada de Roberto Duailibi até o mais recente lançamento do Eduardo Gianetti, o “Livro das Citações” (esse eu ainda não tenho, está na minha lista de desejos).

Mas o que eu queria compartilhar aqui são algumas frases do “401 design meditations”, um trabalho meticuloso da Catherine Fishel, que reúne idéias de grandes designers do hemisfério norte (pena que a gente ainda não tenha entrado no mapa nesse tipo de estudo). Eles falam da essência do design, do processo criativo, responsabilidades, ferramentas, conselhos e muito mais, sempre em frases concisas e bem-humoradas. Leiam e curtam algumas pérolas:

Bom design é bom negócio” Thomas Watson, Jr. Fundador da IBM

Designers comunicam apenas 3 coisas: mensagens sobre valor, mensagens de valor e mensagens sem valor” Rick Vialicenti

Bom design é uma forma de respeito – da parte de quem produz para a pessoa que irá eventualmente gastar seu suado dinheirinho no produto, usar o produto, possuir o produto” Davis Beown

Branding: persuadir os de fora a comprar e persuadir os de dentro a acreditar” Wally Olins

Design é desejo disfarçado de função” Terence Hiley, Curador do MoMA

Sim, como forma de determinar e influenciar ações de pessoas, fazer design é um ato político” Rudy Vanderlans

Toda noite eu rezo para que os clientes com bom gosto ganhem dinheiro e para os clientes que tenham dinheiro ganhem bom gosto” Bill Gardner

Deus salve nossos arquivos!” Rastko Ciric

O orçamento determina o veículo da idéia, não o alcance da idéia propriamente dita” Thomas Vasquez

Alta qualidade, custo baixo, turnover alto — escolha quaisquer dois” Rob Wallace

Ser um designer famoso é como ser um dentista famoso” Noreen Morioka

Quando estou trabalhando num problema, nunca penso em beleza. Eu penso somente em resolver o problema. Mas quando eu termino, se a solução não é linda, eu acho que está errada” Richard Buckminster Fuller

O bom não é uma categoria que me interesse” Rem Koolhaas

A evolução da forma começa com a percepção da falha” Henry Petrosk

Acidentes somente produzem as melhores soluções se você consegue reconhecer a diferença entre um acidente e uma intenção” Jennifer Morla

Fazer um bom design é fácil. Mas fazer um grande design requer um grande cliente” Michael Osborne.

Um observador inexperiente vê tudo numa figura. Mas um observador experiente, vê apenas as coisas que estão faltando” Rastko Ciric

Bom o suficiente é bom o suficiente se os seus padrões são altos o suficiente” Steve Frykholm

Não existem clientes ruins; apenas designers ruins” Bob Gill

Confusão e bagunça são falhas do design, não atributos da informação” Edward Tufte

Uma grande marca é criada por um designer, mas feita por uma corporação” Paul Rand

Eu digo para mim mesmo todos os dias: Deus mora nos detalhes” Matt Collins

O símbolo é a linguagem no nível molecular” Marty Neumeier

Uma pessoa criativa precisa ser uma sabe-tudo. Ela precisa aprender sobre todos os tipos de coisas: história antiga, matemática do século XIX, técnicas atuais de manufatura, arranjos florais e criação de porcos. Porque ela  nunca sabe quando essas idéias podem vir juntas na forma de uma nova idéia. Isso pode acontecer seis minutos mais tarde, seis meses ou seis anos depois. Mas ela tem fé que isso irá acontecer” Carl Ally

Nós todos somos naturalmente curiosos aos oito anos de idade. Mas a maioria das pessoas, quando ficam mais velhas, ficam menos e menos curiosas, então, pedem a outras pessoas para serem curiosas no lugar delas. É disso que eu vivo” Ron Miriello

Menos é mais quando mais não é bom” Frank Lloyd Wright

Resolver o problema é mais importante que estar certo” Milton Glaser

E a que eu mais gosto: “Nós valorizamos o que nós entendemos” Kevin Walker

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Orgulho manezinho

Olha se não é coisa para ficar orgulhoso: uma empresa jovem (Dois pra Um Design Industrial), formada por egressos dos cursos de design da Udesc e IFSC já abocanhou um superprêmio no Michelin Challenge Design 2011, prestigiado concurso de design automotivo que teve, neste ano, 970 inscritos do mundo inteiro (veja mais sobre o prêmio e os vencedores aqui).

A ideia era que os participantes apresentassem propostas de transporte para 2021 e eles bolaram um carro conceito muito bacana, olha as imagens.

Essa turma não está para brincadeira não, tinha até sido finalista do IDEA Brasil e já está com um jet ski anfíbio em fase de produção (projeto para a empresa K-Jet, veja aqui).

Guarde esses nomes porque você ainda vai ouvir falar: Alexandre dos Santos Turozi, Elisa Strobel, Ivandro de Barros Ribeiro, José Serafim Junior, Mayara Atherino Macedo, Rodrigo Brasil Krieger, Theo Orosco da Silva e Donato Goncalves do Nascimento.

Parabéns e muito sucesso para esses designers que fazem acontecer!

Diploma pra quê?

No final do ano passado, estava ministrando aulas em um MBA quando um funcionário da instituição, bem desanimado, comentou que um primo dele tinha até doutorado e estava ganhando uma miséria fazendo bicos. Aguardava uma bolsa para estudar mais um pouco. Injustiça, né?

Mas será mesmo?

Sinceramente, acho que não. Pela descrição do perfil, parece que o rapaz é estudante profissional. Não há nada de mal nisso, mas que ninguém espere ganhar fortunas dependendo apenas de bolsas de estudo.

O problema é que algumas pessoas costumam levar ao pé da letra aquelas manchetes escandalosas publicadas nas capas de revistas de negócios dizendo que um curso de MBA pode aumentar seu salário em muitos porcento. Vejo gente fazendo as contas do investimento, computando a diferença entre a mensalidade e o incremento no contracheque que espera obter. O problema é que isso não acontece automaticamente, como muitas reportagens querem fazer crer; então, o que se vê por aí é uma legião de pós-graduados subempregados e reclamando da vida.

A questão é que, diferente do que possa parecer, o mercado não faz concursos nem paga mais para quem tem mais diplomas. O mercado remunera melhor quem consegue gerar mais valor, tendo ou não uma pilha de certificados. E é pior contratar uma pessoa sem noção, mas com diploma, pois essa pessoa não vai querer tirar xerox ou fazer serviços “menores”.

O diploma nada mais é do que um comprovante que você teve acesso a um conjunto específico de informações que lhe foram apresentadas de maneira estruturada e com orientação de outros profissionais, supostamente experientes e conhecedores da matéria. Você ganha esse pedaço de papel quando consegue provar para a instituição que o emitiu que conseguiu assimilar essas informações de maneira satisfatória. E só. Lá não tem nada dizendo que agora você é melhor que os outros, que ficou mais inteligente ou que merece um aumento. Pode procurar, garanto que não tem.

Então, como é que o diploma pode ter a ver com aumento de salário? As revistas estariam mentindo?

Não estão. É que, teoricamente, se você tem vários diplomas, teve acesso a vários conjuntos de informações específicas. Isso aumenta muito as suas chances de recombiná-las e criar algo que, de fato, tenha valor para o mercado. Que faça diferença na vida das pessoas. Que seja desejável a ponto de alguém poder pagar mais por isso. Quanto mais cursos, mais combustível e mais matéria prima para converter em excelência. Quem sabe aproveitar isso, ganha mais, claro.

Se, ao contrário, o sujeito pega o papel, emoldura ou então guarda na gaveta e esquece as tais informações, sem fazer nada de útil com isso, então, sinto informar, mas valeria mais a pena ter ficado em casa vendo novela. Seria mais barato e menos frustrante. Há alunos que estão claramente perdendo o seu tempo: pagando as prestações de um diploma que não servirá absolutamente para nada, uma vez que não estão interessados em gerar valor, mas em aumentar o salário.

Vejo um montão de gente por aí que apenas coleciona certificados; não aplica o que aprendeu (se é que aprendeu alguma coisa), não se interessa em fazer coisas novas e interessantes, não transforma o conhecimento em algo útil, e, pior, ainda sai por aí cheio de razão reclamando direitos.

Diploma, sem um profissional que o converta em valor que faça uso do que ele representa, é só um pedaço de papel. Igual àquele que embrulhava o pão antigamente, só que muito menos útil.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Pra que brigar?

Fotografia: Geoffrey Cottenceau

Você já reparou que as pessoas que pensam como nós são sensíveis, inteligentes e muito, mas muito simpáticas? E quem discorda da gente é feio, chato, ignorante? Pois é, só que conviver só com essa gente bacana não nos faz evoluir muito, nem amadurece nosso processo de aprender a tomar decisões. É saudável ser confrontado com o diferente, com o aparentemente absurdo, com o contraditório. É justamente o que abre a nossa cabeça e nos faz aprender (Epíteto já dizia que “é impossível aprender aquilo que se pensa que já é sabido“).

Roger Martin, no excelente e imperdível “Integração de ideias: como usar as diferenças para potencializar resultados” apresenta uma maneira de tirar proveito de ideias conflitantes para solucionar problemas. Ele começa o livro com uma frase de F. Scott Fitzgerald que diz tudo: “o teste de uma grande inteligência é a faculdade de sustentar duas ideias opostas na mente e ainda manter a capacidade de funcionar“. Tente isso em casa, mas já vou avisando que doi, e muito.

Roger pesquisou muitos líderes e chegou à conclusão que os mais brilhantes tinham a predisposição de manter duas ideias diametralmente opostas na mente e, sem entrar em pânico ao ter que decidir entre uma alternativa e outra, eram capazes de produzir uma solução original que sintetizava o melhor das duas. Estudando bastante, ele conseguiu sistematizar o método que essas pessoas excepcionais usam intuitivamente.

Martin chamou o método de “pensamento integrador” e parte do princípio que as tomadas de decisão não precisam ser do tipo trade-off (ou isto ou aquilo). A gente sempre pode escolher isso E aquilo se souber combiná-los de uma maneira criativa e original.

Vale ressaltar que o autor argumenta que o pensamento integrador não se ensina, mas é possível desenvolver habilidades em mentes oponíveis (aquelas que não excluem alternativas) e ir aprimorando a prática de tomada de decisões até chegar à excelência.

Bom, desmontando a maneira como esses líderes destacados bolam sacadas geniais, Roger descobriu a seguinte sequência de habilidades desenvolvidas:

1)   Primeiro, é preciso destacar o que ele chama de características salientes para a tomada de decisão. Isso quer dizer selecionar o que é importante em cada uma das alternativas. É claro que isso varia de pessoa para pessoa, e só a prática vai impedir que nos esqueçamos de pontos essenciais. A pergunta que se faz aqui é: “que características considero importantes?”

2)   Segundo, há que se considerar que essas características salientes têm relações umas com as outras, e elas podem ser multidirecionais e não-lineares. Então, é preciso identificar as relações de causa e efeito entre essas coisas, etapa que ele chama de causalidade. Aqui a pergunta é: “como dar sentido ao que observo?

3)   O terceiro passo é montar uma arquitetura de informações para que a coisa toda tenha uma sequência lógica. É importante não se perder a noção do todo, enquanto se analisa as partes. Aliás, a ideia é responder à pergunta: “que tarefas executarei, e em que ordem?

4)   O quarto e último passo é a resolução, a busca de soluções criativas. A pergunta é: “como saberei quando tiver terminado?

Parece complicado e é; mas muito esclarecedor e instigante. Penso só ser possível entender bem a linha de raciocínio com os exemplos detalhados que Roger apresenta no livro, como decisões estratégicas da Procter&Gamble, Red Hat Software e Four Seasons Hoteis.

Mas uma coisa fundamental mesmo nessa história toda é a pessoa conseguir separar percepção de realidade. Se ela conseguir se dar conta de o que vê é apenas parte da questão (sua percepção, seu ponto de vista) e não a realidade em si, já é meio caminho andado. É impressionante como a gente cai fácil na armadilha de achar que o que a gente vê é o que realmente é. Diferenciar percepção de realidade é a base para acolher ideias diferentes (aliás, esse é o único jeito possível, já que podemos considerar infinitas percepções, mas não infinitas realidades).

Roger Martin é um pensador brilhante e, não por acaso, também é o autor de “The design of business“, onde apresenta o hoje famoso conceito de design thinking, obra também essencial da qual falaremos outro dia.

Interessante é que li “O pensamento integrador” ao mesmo tempo de “PO: Além do sim e do não“, do Edward de Bono, dez anos mais antigo (1997), que apresenta outra maneira de eliminar decisões trade-offs (achei num sebo). Bono é o criador do conceito de pensamento lateral, e da técnica dos seis chapeus, entre outras coisas bacanas. Bom, só posso dizer que misturei tudo e minha cabeça está com o funcionamento prejudicado por causa do excesso de ideias contraditórias…

Até onde consigo ver, eliminar decisões baseadas em sim/não parece uma tendência. E vocês; acham que sim ou que não?

Ligia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

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PS: Ah, obrigada à Denise Eler pela dica desse livro do Roger Martin que eu não conhecia. Ela indicou outro também excelente que ainda não terminei, mas conto aqui depois. Menina esperta e cheia de dicas ótimas, essa Denise (com um blog imperdível).

Design de muros

Ilustração: Karez
Ilustração: Karez

Há algumas semanas escrevi uma coluna que falava da regulamentação da profissão de designer. Eu questionava os benefícios que o cliente teria com a medida. A ideia não era desencadear uma campanha anti-regulamentação, mas entender melhor os ângulos da questão para que as pessoas que estavam em dúvida como eu pudessem ter mais elementos para formar a sua opinião.

Recebi muitos comentários e contribuições de pessoas que estão há muito tempo na luta pela regulamentação da profissão. Os argumentos eram numerosos: alguns bastante fortes e convincentes; outros, na minha opinião, só faziam número. De qualquer maneira, um argumento em especial, apresentado pelo professor Freddy Van Camp, foi matador. Finalmente me convenci (e me entristeci muito também).

O professor Freddy me explicou o seguinte: as profissões que já estão regulamentadas ou em vias de podem facilmente tomar para si as atribuições do designer, de maneira que, se nada for feito, o exercício da profissão pode se tornar impraticável (isso é um resumo bem simplista de tudo o que ele disse, mas foi o que entendi). Só como exemplo, nada impede que um arquiteto, que tem sua profissão regulamentada, coloque lá no seu estatuto que só ele pode desenvolver projetos de mobiliário.  Ou que os publicitários definam que só os de sua classe podem criar marcas gráficas.

Isso é, de fato, uma ameaça real, e a regulamentação não apenas se torna importante como também urgente.

Fui lendo o que ele escrevia e um quadro ia se formando na minha mente. Um vasto terreno sendo cercado pouco a pouco, cada profissional cuidando do seu quadrado e esperando o do lado bobear para expandir seus domínios. Os designers, perplexos com a movimentação, vão assistindo impotentes sua terra ser tomada, uma vez que não têm escritura pública.

Acho isso tudo muito triste. Na real, sou a favor da liberdade de atuação; sempre achei que não falta trabalho para quem é excelente e quem é medíocre não merece proteção profissional. Nunca me preocupei com rótulos, por isso tinha (e continuo tendo) certa alergia a esse tipo de coisa, ainda mais se considerar a amplitude e a multidisciplinaridade  do design.

Penso que os profissionais deveriam construir pontes, não muros. Construir muro dá muito trabalho e leva ao isolamento. Muro também afasta clientes, na minha opinião, e todo esse talento poderia ser gasto para crescer, se organizar, ficar melhor.

Mas sob a ameaça de invasão, fazer o quê? Tristes tempos esses onde tantos usam sua energia para derrubar muros e outros ainda precisam se ocupar em construi-los…

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Os afins que se unam

Fotografia: Martin Parr

A gente sabe que há bons e maus profissionais, e sabe também que essa avaliação é muito subjetiva. Há quem acredite que regulamentar as profissões iria, entre outras coisas, resolver também o problema dos profissionais sem escrúpulos. Será?

Algumas das profissões mais populares no Brasil são regulamentadas, ou seja, têm conselhos que fiscalizam a atuação dos profissionais credenciados. Do jeito que a coisa funciona hoje, para poder atuar na maior parte dessas áreas a pessoa só precisa ter um diploma provando que se formou; aí se inscreve no conselho e ganha uma carteirinha, que nada mais é do que um diploma em miniatura plastificado; enquanto a sua anuidade estiver em dia, você pode usar a tal carteirinha e exercer a profissão.

No final das contas, da maneira que o modelo está desenhado, os conselhos têm como principal razão da sua existência garantir a reserva de mercado para os tais que têm carteirinha e pagam as anuidades religiosamente. Se alguém fizer uma pesquisa séria sobre o que vai na cabeça desses profissionais é capaz de descobrir que a carteirinha é a única coisa que todos os membros têm em comum de fato.

Seria muito bacana se, além disso, os conselhos conseguissem manter um certo nível de qualidade na prestação de serviços. Pena que não é o que acontece, olha só: alguém já viu um contador perder a licença porque calculou errado um imposto e por causa disso o empreendedor perdeu seus bens para pagar a dívida que ele nem sabia que tinha quando o fisco descobriu? Já vi isso acontecer mais de uma vez e o contador fez cara de paisagem; o conselho só diz que erros acontecem. Alguém já viu um administrador ser impedido de exercer seu ofício por má gestão ou por fazer uma empresa falir?

Eu mesma já entrei com uma reclamação no conselho de ética da OAB porque o advogado abandonou a causa após receber os honorários. O distinto já tinha uma lista respeitável de reclamações e foi chamado para uma acareação. Resumo da história: perdi uma manhã de trabalho para assisti-lo levar um sermãzinho do tipo “Aiaiaiai, que feio, não faça mais isso”. Fomos embora para casa e o tal mudou de endereço sem deixar rastro; deve estar por aí, livre, leve e solto enganando outros incautos. Médico, para perder a tal carteirinha, só depois que a lista de processos ultrapassar 3 dígitos e ele sair na TV acusado na justiça comum pela reponsabilidade da morte de uns 3 ou 4. Acho que o CREA também recolhe a carteirinha de volta, mas somente depois que o prédio está condenado ou cai; se você é um engenheiro de sistemas e projeta uma rede de dados ineficiente ou mal dimensionada, a solução mais comum que tenho visto é demitir o sujeito e contratar outro melhor. Ou seja, o modo mais acessível de você fazer um mau profissional perder o direito de atuar é desviando o bloqueto de pagamento da anuidade; as outras formas são infinitamente mais difíceis.

O que eu não consigo ver, por mais que procure, é onde está o valor para o cliente; onde está o compromisso com valores éticos de sustentabilidade; onde está a utilidade pública dessa estrutura tão complexa (e cara).

Podem me acusar, com toda razão, da minha análise ser superficial, simplista e grosseira; ela o é de fato. Mas, na essência, foi só o que consegui ver da minha limitada experiência com essas organizações. Se alguém tem mais para dizer, sou toda ouvidos.

Até ontem, antes de pensar com bastante cuidado a esse respeito, eu era totalmente a favor da regulamentação das profissões em geral, e da de designer em particular. Mas aí fico pensando: é mais uma reserva de mercado, não garantia de qualidade ou valor para o cliente. Boa parte não está registrado porque quer ou concorda com o sistema, mas porque é obrigado a isso. Se já é quase impossível punir um médico por má conduta, imagine só um designer, cuja avaliação do trabalho é tão mais subjetiva.

Garantir que o profissional é competente porque tem diploma é uma leviandade, que se agrava a cada dia com a proliferação de indústrias de diplomas que infestam todas as cidades. E mesmo a OAB, que faz prova, dificilmente consegue banir um mau caráter; é mais ou menos como político – o cara tem que aprontar muito, mas muito mesmo, e deixar um monte de provas espalhadas. Ainda assim eles vão estudar o caso.

E aí, será que a solução é desregulamentar todo mundo, extinguir os conselhos e se virar cada um por si e o cliente que pague a conta?

Penso que não. Os conselhos não são adequados porque o modelo no qual eles se baseiam é jurássico, completamente fora do nosso tempo. Mas outros países, que já reconheceram a inadequação desse sistema, encontraram soluções engenhosas e estão tocando a vida.

Uma das soluções são associações profissionais fortes, que possuem um código de conduta inteligível e acessível para todos, associados ou não. Quem quiser fazer parte precisa obedecer ao tal código, entre outros requisitos. As associações podem ter qualquer mote ou filosofia, desde que isso seja claramente comunicado para o público. Como ninguém é obrigado a se associar, as pessoas se agrupam por vontade própria e ideais comuns, o que torna a organização mais atuante. Se o profissional não compartilha das ideias, simplesmente não se associa; pode se associar a outra entidade ou a nenhuma.

Do ponto de vista do cliente, ele pode escolher contratar alguém com o aval de uma associação cujas práticas ele já conhece (claro que o trabalho de divulgação precisa ser intenso), contratar alguém de outra associação (porque concorda mais com as ideias) ou simplesmente contratar um profissional que não tem a chancela de ninguém por sua própria conta ou risco.

Assim, o cliente não precisa ser preocupadíssimo com a sustentabilidade (a pessoa tem o direito de escolher ser ecologicamente incorreto, se quiser) e contratar profissionais que cumpram a lei (é claro), mas foquem na competitividade e inovação a qualquer custo, por exemplo. Sem problemas, desde que o cliente tenha afinidade com o modus operandi do grupo.  O importante é que as coisas sejam claras para todo mundo e que o cliente possa escolher por afinidade.

O que eu penso que não funciona é colocar todo mundo no mesmo balaio, de uma maneira completamente forçada, e empurrar goela abaixo um código de ética que poucos lêem. Se o sujeito é mais conservador, vai procurar fornecedores que sejam mais parecidos com sua maneira de pensar. Se o cliente quer ousadia nas soluções, mas está preocupado com o ambiente, há outra associação com esse foco. Escolher com informação e consciência é muito melhor para todo mundo.

Há agências que não trabalham com cigarro ou bebidas alcoólicas por livre escolha – podiam constituir uma associação e inspirar outras que pensam igual mas acreditam ser impossível. Há até uma agência de propaganda aqui de Florianópolis que levou a sua ousadia a um ponto em que eu nunca tinha visto: colocou um manifesto em seu site dizendo com todas as letras que mídia não é fonte de receita para eles (o nome da agência é Glóbulo Célula Criativae sou fã de carteirinha, sem trocadilho). E se esses corajosos se unissem em uma associação?

Mesmo aqui no Brasil, já temos pelo menos um exemplo bem sucedido, quer ver? Se você for fazer uma cirurgia plástica, nem perca tempo pedindo o CRM do doutor; vá no site daSociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e veja se ele é associado. Os requisitos para fazer parte são muito mais rígidos que para obter uma licença do conselho e eles levam muito a sério a gestão dessa marca de qualidade. Eu, pelo menos, nunca vi um membro envolvido em escândalos (aliás, só soube da sua existência porque cada vez que aparece no jornal alguma vítima de plástica mal feita aparece um representante dizendo que o médico não era credenciado pela Sociedade).

Se a pessoa não quiser contratar um profissional associado, problema dela, é sua livre escolha. Se um profissional não quiser se associar, idem. Mas as pessoas que se preocupam com a formação de quem vai mexer no seu corpo, têm o direito de ter uma garantia maior do que a que o conselho oferece.

Por que não fazer algo parecido com designers e publicitários?

É claro que a execução não é simples, mas achei a ideia muito boa. Acredito que vale a pena gastar um tempo pensando mais a respeito.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Quer trabalhar na Globo.com?

A Natasha me mandou um convite que pode interessar a bastante gente, olha só. A globo.com tem 2 vagas de estágio para designers se formando em 2010 e 2011 e está com dificuldade de encontrar candidatos por causa das férias. Se você está ligado, aproveite! Mande seu currículo, bem como os links de seu blog, twitter e perfil de redes sociais para [email protected]. Se quiser mais detalhes sobre o trabalho, acesse aqui.

Sobre designers e pessoas

fernandopessoa

Nos últimos tempos venho sendo assaltada por uma sensação incômoda quase toda vez que tenho a oportunidade de ver designers apresentarem seus projetos, sejam estudantes de graduação, pós-graduação, ou mesmo profissionais atuantes no mercado. Levei um tempo para identificar o problema, mas creio que agora o descobri.

É o seguinte: os designers estão se esquecendo das pessoas.

De onde consigo observar, a principal diferença entre a engenharia e o design (já disse isso aqui outras vezes) é a estética no seu sentido amplo. Tanto a engenharia como o design preocupam-se com o conceito, o projeto, a escolha dos materiais, o processo produtivo e o ciclo de vida do produto. Mas para a engenharia, o foco é a máquina e seu desempenho. Para o design, o foco é a pessoa, o ser humano (foi por isso que migrei da engenharia para o design; estava sentindo falta da estética).

Na sua origem, aesthesis significa aquilo que é sensível, que afeta os sentidos — como as pessoas sentem, vêem, cheiram, tocam e ouvem. Tornar a interação entre a pessoa e o objeto uma experiência útil, produtiva e prazerosa é função primordial de qualquer projeto executado por um designer; e isso, em última instância, é função da estética. Designers existem para servir as pessoas, tornar sua estada no planeta melhor e inclusive, ajudar a preservar o tal planeta.

Então, como explicar que que a etapa do projeto em que se pergunta, questiona, estuda e observa as pessoas, tem desaparecido das apresentações como que por encanto, sem deixar rastros?  Até onde sei, as informações do usuário são parte fundamental e imprescindível do método projetual.

O profissional (sempre alegando falta de tempo) utiliza pesquisas secundárias e infere que já sabe o que é melhor para o usuário. Vamos fazer assim porque pesquisas científicas desenvolvidas por britânicos na Transilvânia concluíram que pessoas com esse perfil gostam disso; vamos fazer assado porque a tendência em voga em Adis Abeba aponta para esse caminho. E onde ficam as pessoas que vão usar o produto, aquelas de carne e osso, não as das estatísticas?

Já questionei isso algumas vezes, e a resposta azeda que sempre recebo é “na prática a teoria é outra“. É mesmo? Então por que o profissional que diz isso sempre tem (ou quer ter) um MBA no currículo? Desculpem, mas, para mim, quem usa uma teoria diferente na prática ou não aprendeu a teoria ou então leu e não entendeu nada. Profissional excelente usa a teoria sim, fundamenta seus conceitos sim e, principalmente, considera o método projetual uma referência importante. E pensa nas pessoas como seres humanos, não objetos abstratos ou números.

Outra desculpa já bem rodada é a clássica “falta de tempo“. Ora, penso que tudo é uma questão de como o profissional se organiza para trabalhar, como elege suas prioridades. Se ser excelente é prioridade, então não dá para fazer de qualquer jeito. Se o designer gasta sua vida e competência simplesmente correndo atrás dos prazos, sem nenhum controle da situação, corre o sério risco de perder a sua dignidade profissional e virar uma bela abóbora, que só faz rolar ladeira abaixo ao sabor a geografia.

O tempo é igual para todo mundo e alguns dos melhores profissionais que conheço encontram um intervalo para ler poesia, fazer música, praticar esportes e até, veja só, observar pessoas. Há até quem, não contente em apenas ler, inclusive escreva poesia. O que me faz lembrar o verso do genial Caetano que fala do poeta português na indefectível música Língua: “Gosto do Pessoa na pessoa“.  Eu também.

E ainda acrescentaria que gosto mais ainda da pessoa no designer.

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Rock bambu

Para quem ainda não sabe, bambu é um tipo de grama. Por causa disso, ele cresce bem rápido e apresenta propriedades parecidas com a madeira, o que faz dele um excelente substituto para esse material tão nobre (dá para fazer até papel de bambu). Os designers não param de estudar coisas que se pode fazer com esse material barato e sustentável e as aplicações são as mais criativas.  Pois a Agência Bambu de Conhecimento em parceria com a MODO Design ganhou o troféu  prata na categoria Ecodesign do IDEA Brasil 2009 com o projeto da Guitarra Digital JAM. Rock, design e bambu, uma combinação inusitada que tem tudo para ser um sucesso!

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Falando de design…

aspas
Se tem alguma coisa que admiro é a capacidade que algumas pessoas têm de cunhar frases que conseguem sintetizar um mundo de idéias em poucas palavras. Oscar Wilde é um dos meus preferidos, o cara era um gênio mesmo. Há várias compilações muito boas que vão da clássica coleção sempre reeditada de Roberto Duailibi até o mais recente lançamento do Eduardo Gianetti, o “Livro das Citações” (esse eu ainda não tenho, está na minha lista de desejos).

Mas o que eu queria compartilhar aqui são algumas frases do “401 design meditations”, um trabalho meticuloso da Catherine Fishel, que reúne idéias de grandes designers do hemisfério norte (pena que a gente ainda não tenha entrado no mapa nesse tipo de estudo). Eles falam da essência do design, do processo criativo, responsabilidades, ferramentas, conselhos e muito mais, sempre em frases concisas e bem-humoradas. Leiam e curtam algumas pérolas:

“Bom design é bom negócio” Thomas Watson, Jr. Fundador da IBM
“Designers comunicam apenas 3 coisas: mensagens sobre valor, mensagens de valor e mensagens sem valor” Rick Vialicenti
“Bom design é uma forma de respeito – da parte de quem produz para a pessoa que irá eventualmente gastar seu suado dinheirinho no produto, usar o produto, possuir o produto” Davis Beown
“Branding: persuadir os de fora a comprar e persuadir os de dentro a acreditar” Wally Olins
“Design é desejo disfarçado de função” Terence Hiley, Curador do MoMA
“Sim, como forma de determinar e influenciar ações de pessoas, fazer design é um ato político” Rudy Vanderlans
“Toda noite eu rezo para que os clientes com bom gosto ganhem dinheiro e para os clientes que têm dinheiro ganhem bom gosto” Bill Gardner
“Deus salve nossos arquivos!” Rastko Ciric
“O orçamento determina o veículo da idéia, não o alcance da idéia propriamente dita” Thomas Vasquez
“Qualidade, custo, turnover alto — escolha quaisquer dois” Rob Wallace
“Ser um designer famoso é como ser um dentista famoso” Noreen Morioka
“Quando estou trabalhando num problema, nunca penso em beleza. Eu penso somente em resolver o problema. Mas quando eu termino, se a solução não é linda, eu acho que está errada” Richard Buckminster Fuller
“O bom não é uma categoria que me interesse” Rem Koolhaas
“A evolução da forma começa com a percepção da falha” Henry Petrosk
“Acidentes somente produzem as melhores soluções se você consegue reconhecer a diferença entre um acidente e uma intenção” Jennifer Morla
“Fazer um bom design é fácil. Mas fazer um grande design requer um grande cliente” Michael Osborne.
“Um observador inexperiente vê tudo numa figura. Mas um observador experiente, vê apenas as coisas que estão faltando” Rastko Ciric
“Bom o suficiente é bom o suficiente se os seus padrões são altos o suficiente” Steve Frykholm
“Não existem clientes ruins; apenas designers ruins” Bob Gill
“Confusão e bagunça são falhas do design, não atributos da informação” Edward Tufte
“Uma grande marca é criada por um designer, mas feita por uma corporação” Paul Rand
“Eu digo para mim mesmo todos os dias: Deus mora nos detalhes” Matt Collins
“O símbolo é a linguagem no nível molecular” Marty Neumeier
“Uma pessoa criativa precisa ser uma sabe-tudo. Ela precisa aprender sobre todos os tipos de coisas: história antiga, matemática do século XIX, técnicas atuais de manufatura, arranjos florais e criação de porcos. Porque ela nunca sabe quando essas idéias podem vir juntas na forma de uma nova idéia. Isso pode acontecer seis minutos mais tarde, seis meses ou seis anos depois. Mas ela tem fé que isso irá acontecer” Carl Ally
“Nós todos somos naturalmente curiosos aos oito anos de idade. Mas a maioria das pessoas, quando ficam mais velhas, ficam menos e menos curiosas, então, pedem a outras pessoas para serem curiosas no lugar delas. É disso que eu vivo” Ron Miriello
“Menos é mais quando mais não é bom” Frank Lloyd Wright
“Resolver o problema é mais importante que estar certo” Milton Glaser
E a que eu mais gosto: “Nós valorizamos o que nós entendemos” Kevin Walker
Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Bom design é bom negócio” Thomas Watson, Jr. Fundador da IBM

Designers comunicam apenas 3 coisas: mensagens sobre valor, mensagens de valor e mensagens sem valor” Rick Vialicenti

Bom design é uma forma de respeito – da parte de quem produz para a pessoa que irá eventualmente gastar seu suado dinheirinho no produto, usar o produto, possuir o produto” Davis Beown

Branding: persuadir os de fora a comprar e persuadir os de dentro a acreditar” Wally Olins

Design é desejo disfarçado de função” Terence Hiley, Curador do MoMA

Sim, como forma de determinar e influenciar ações de pessoas, fazer design é um ato político” Rudy Vanderlans

Toda noite eu rezo para que os clientes com bom gosto ganhem dinheiro e para os clientes que têm dinheiro ganhem bom gosto” Bill Gardner

Deus salve nossos arquivos!” Rastko Ciric

O orçamento determina o veículo da idéia, não o alcance da idéia propriamente dita” Thomas Vasquez

Qualidade, custo, turnover alto — escolha quaisquer dois” Rob Wallace

Ser um designer famoso é como ser um dentista famoso” Noreen Morioka

Quando estou trabalhando num problema, nunca penso em beleza. Eu penso somente em resolver o problema. Mas quando eu termino, se a solução não é linda, eu acho que está errada” Richard Buckminster Fuller

O bom não é uma categoria que me interesse” Rem Koolhaas

A evolução da forma começa com a percepção da falha” Henry Petrosk

Acidentes somente produzem as melhores soluções se você consegue reconhecer a diferença entre um acidente e uma intenção” Jennifer Morla

Fazer um bom design é fácil. Mas fazer um grande design requer um grande cliente” Michael Osborne.

Um observador inexperiente vê tudo numa figura. Mas um observador experiente, vê apenas as coisas que estão faltando” Rastko Ciric

Bom o suficiente é bom o suficiente se os seus padrões são altos o suficiente” Steve Frykholm

Não existem clientes ruins; apenas designers ruins” Bob Gill

Confusão e bagunça são falhas do design, não atributos da informação” Edward Tufte

Uma grande marca é criada por um designer, mas feita por uma corporação” Paul Rand

Eu digo para mim mesmo todos os dias: Deus mora nos detalhes” Matt Collins

O símbolo é a linguagem no nível molecular” Marty Neumeier

Uma pessoa criativa precisa ser uma sabe-tudo. Ela precisa aprender sobre todos os tipos de coisas: história antiga, matemática do século XIX, técnicas atuais de manufatura, arranjos florais e criação de porcos. Porque ela nunca sabe quando essas idéias podem vir juntas na forma de uma nova idéia. Isso pode acontecer seis minutos mais tarde, seis meses ou seis anos depois. Mas ela tem fé que isso irá acontecer” Carl Ally

Nós todos somos naturalmente curiosos aos oito anos de idade. Mas a maioria das pessoas, quando ficam mais velhas, ficam menos e menos curiosas, então, pedem a outras pessoas para serem curiosas no lugar delas. É disso que eu vivo” Ron Miriello

Menos é mais quando mais não é bom” Frank Lloyd Wright

Resolver o problema é mais importante que estar certo” Milton Glaser

E a que eu mais gosto: “Nós valorizamos o que nós entendemos” Kevin Walker

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br

Arquitetura do design

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Se tem uma coisa que causa mal estar entre os designers é um arquiteto se intitular um deles. Para boa parte dos designers, arquitetura e design são disciplinas completamente distintas, só tendo em comum a preocupação estética que seus praticantes comungam. Para mim, não é só isso. Como defendo a definição do design (longe de ser unânime, bem lembrado) onde ele se sustenta sobre o tripé projeto, conceito e estética, penso, sim, que os arquitetos são designers também, já que a arquitetura baseia-se igualmente nessa trindade. 

 

Mas alto lá. Isso não significa que arquitetos possam sair por aí livremente criando marcas gráficas, websites, embalagens ou luminárias. O curso de arquitetura não contempla essas habilitações e penso ser saudável respeitar as limitações que cada formação impõe. Arquitetos são designers sim, mas de um tipo de produto muito especial, que os outros designers de produto não costumam (e nem possuem qualificação) meter o notebook. Arquitetos projetam objetos de morar, de trabalhar, de conviver, de se divertir. E isso não é nem de longe pouca coisa; portanto, não há mesmo razão deles quererem projetar marcas também.

 

Alain de Botton, no seu ótimo “Arquitetura da Felicidade”, acerta em cheio quando diz que somos incovenientemente vulneráveis ao ambiente que nos cerca. A cor das paredes, o formato do sofá, o desenho do tapete, tudo influencia o nosso humor, mesmo que a gente não perceba. Eu, pelo menos, não consigo produzir em ambientes feios (claro que esse “feio” é compatível com as minhas referências estéticas). Fico triste, de mau-humor, quero sair. Concordo com Botton que, no fundo, todas as almas sensíveis são afetadas pelo cenário. Você não está nem aí para a estampa do sofá? Pois o Alain advoga que aquelas pessoas que aparentemente não se comovem com o entorno estão, na verdade, protegendo-se da possibilidade da angústia de serem expostas à ausência da beleza. Sabe aquele tipo estóico, que vive se economizando, que não se apega para não sofrer depois? Quem sabe não é você?

 

Para os afoitos de plantão (sempre aparece alguém com esse argumento), não custa lembrar que a estética não tem nenhuma relação com dinheiro. Sensibilidade não tem classe social e pode-se fazer maravilhas com um caixote de madeira ou um banquinho feito no quintal. Da mesma forma, torneiras de ouro e tapetes de pele de onça importada das savanas africanas estão longe de serem sinônimos de harmonia visual.

 

Você já percebeu que, assim como a roupa, a casa de uma pessoa também pode dizer muito sobre ela? Os estilos arquitetônicos são muitos, e, mesmo que nem sempre a gente possa escolher com total liberdade a cara do lugar onde vai morar, é nas adaptações e nos detalhes que as personalidades se revelam. De anões de jardim a portões automáticos; de janelas trancadas a varandas floridas; de lixo espalhado a luzes de natal; tudo depõe sobre o jeitão de quem tomou as decisões estratégicas no lar-doce-lar.

 

Da mesma forma, fachadas de edifícios públicos contam a história de seus governantes; a organização de uma cidade fala muito da cultura de seu povo; empresas grandes e pequenas  entregam os segredos de seus gestores; imponência, solidez, amadorismo, descaso, competência, cuidado, fragilidade, orgulho, ostentação, extravagância, discrição, bizarrice – quase tudo pode ser dito pelas paredes dos lugares onde se vive, trabalha, estuda ou namora.

 

Botton ousa dizer que o desenho de qualquer objeto transmite impressões de atitudes psicológicas e morais. Afirma que a personalidade das coisas pode ser julgada a partir de características aparentemente inexpressivas, e exemplifica: a mudança de poucos graus no ângulo da borda pode transformar uma taça de vinho de arrogante a recatada. Lembra que uma cadeira com estruturas curvas é facilmente associada ao acolhimento, à desenvoltura e às brincadeiras, ao passo que uma de traços retos transmite sobriedade, concisão e racionalidade. E faz uma brincadeira divertida: mostra as fotografias de três torneiras diferentes e pergunta de qual delas gostaríamos de ser amigos. É impressionante como a gente simpatiza mesmo com apenas uma.

 

Alain nos alerta que idéias políticas e éticas podem ser escritas em esquadrias de janelas e maçanetas de portas; em grandes construções ou pequenos casebres; em jardins, avenidas, viadutos e até num espremedor de limão. É essa missão que une o design à arquitetura; juntos, eles traduzem uma civilização. Para uma tarefa tão grandiosa e de tão grande responsabilidade, conviria que deixassem de lado essas rivalidades tão vãs…

  

Lígia Fascioni | www.ligiafascioni.com.br